Análise Hertzbergeriana
Circulação e permanência
![]() |
3º Andar. Corredor. Escola de Arquitetura (UFMG) |
Esse comentário fará uma análise do corredor do terceiro andar da Escola de Arquitetura e Design da UFMG com base em alguns aspectos e conceitos presentes no livro “Lições de Arquitetura” de Herman Hertzberger.
Os corredores de escolas, hotéis, prédios, hospitais etc. costumam ser associados a locais de transição e circulação de pessoas e que marcam seus deslocamentos entre espaços mais privados e particulares, onde ocorrem determinadas atividades (como as salas de aula). Assim, é comum a visão de que tais ambientes de intervalo que interligam essas atividades, que contemplam mais tempo e esforços, não são capazes de propiciar interações múltiplas e mais profundas entre os indivíduos do que apenas algumas trocas de olhares rápidas, esbarrões e conversas apressadas entre os intervalos das aulas ou o início e término delas. Entretanto, é importante ressaltar que o corredor do terceiro andar da Escola de Arquitetura acaba desempenhando funções que extrapolam o seu projeto inicial ao mesclar a funcionalidade de um espaço de circulação que facilita diferentes acessos, com a sua polivalência, resultante da capacidade de proporcionar a convivência de diversas pessoas (como alunos e funcionários) e as múltiplas interações com o ambiente.
A demarcação do ambiente privado, ou melhor dizendo do "espaço privado", ainda que seja uma delimitação realizada a partir de barreiras físicas (muros, paredes, portas, etc.) que buscam explicitar esse aspecto torna-se uma nuance difícil de ser reconhecida e até mesmo diferenciada do "espaço público" nos espaços de transição: corredores. Dessa forma, nesses espaços é notória a vigência de uma mescla de elementos de cunho característico dos espaços privados (salas e departamentos), bem como públicos (escaninhos, corrimões, cadeiras) que acabam por agir como fatores determinantes sobre o comportamento dos indivíduos nesses espaços, que também se torna flexível e adaptável. Ainda que os corredores sejam meios de transição, servindo de ambientes intermediadores para a chegada e ocupação das salas ("os verdadeiros espaços privados"), a interação e transição nesses, ainda que cotidiana, comumente ainda é tida sob um aspecto superficial, quase imperceptível, de modo que margens para uma imersão e ocupação desse ambiente não se torna uma realização (ainda que possível).
![]() |
Mulher parada no corredor utilizando notebook. |
"Aquele que corre muito; que ou o que participa de corridas; trecho estreito; espaço coberto de transição"; etc. Variadas são as definições sobre esse espaço que, inconscientemente, impõe ao usuário a forma e o modo como tais espaços serão utilizados sem que possibilidades e alternativas de uso sejam exploradas; "a forma segue a função", onde o leque de funções torna-se limitante pelas formas (definições) impostas.
Corredores como espaços interativos:
Nesse sentido, pode-se relacionar o espaço desse corredor com a ideia das ruas proposta por Hertzberger, já que, de acordo com ele, devemos aproveitar todas as oportunidades possíveis para evitar uma separação rígida das habitações (que no caso analisado poderiam ser comparadas às salas e banheiros) e estimular o que restou do sentimento de participar de algo que nos é comum. O corredor portanto, promove não só a interação cotidiana como também pode ser o local para a realização de atividades comunitárias. A exemplo disso pode ser desenvolvida a ideia de que o seu formato comprido, porém estreito facilita a aproximação física e interativa das pessoas nos intervalos e nos momentos que antecedem as aulas, já que é bastante comum que os alunos se assentem no chão enquanto conversam entre si e dividam lanches.
![]() |
Estudantes sentados no corredor para a realização de aula EAD(UFMG) |
Além disso, destaca-se o fato de que tal ambiente analisado também é utilizado para a exposição de trabalhos acadêmicos realizados pelos estudantes, geralmente pregados nas paredes externas das salas de aula para que pessoas de um círculo social mais amplo possam ver e ter acesso a eles de maneira mais simples e direta - podendo até mesmo proporcionar momentos de pausa e contemplação em meio à correria da rotina. Outro uso desse ambiente, registrado pelos estudantes de arquitetura na fotografia X é a execução de trabalhos durante a madrugada, já que é um espaço plano, bem iluminado e sem muitos obstáculos fixos, características essas que facilitam o processo de criação dessas tarefas em grupos. Esses pontos acentuam os conceitos de funcionalidade, flexibilidade e polivalência desenvolvidos no livro de Hertzberger, uma vez que, como ilustrado, o corredor em questão proporciona diversas interpretações coletivas e individuais acerca de seu espaço, abarcando as multiplicidades de seus usuários e libertando a forma corriqueira e banalizada de seus significados e propósitos cristalizados.
![]() |
Boneco de fita instalado no teto do correro. EAD(UFMG) |
"Organização e a composição artística de elementos no ambiente que possuem um caráter efêmero" é a definição que consagra as "instalações artísticas". Todavia, a presença do elemento artístico nessa definição é o fator atenuante que difere as instalações do que são os espaços de transição (corredores), ou seja, é a diferenciação para a ocupação e imersão desses meios ou para a sua utilização desconectada e superficial. É notório, porém, que uma vez realizado o estímulo e o impulso artístico, a forma e a definição, até então limitantes, abrem margem para que os corredores possam ser espaços de agregação, e não apenas de transição, não apenas dos elementos componentes, mas dos indivíduos que abandonam o posto de objetos efêmeros para serem atuadores.
Outra característica interessante de ser contemplada é a presença dos conjuntos de pequenos armários (escaninhos) para guardar objetos de uso pessoal dos funcionários e de alguns alunos, como os materiais de aula. Na realidade, essa afirmação acaba sendo uma suposição, visto que, durante os nossos poucos dias frequentando a escola de arquitetura, não tivemos a oportunidade de observar o uso recorrente desses armários. No entanto, e com base nesse pensamento, é possível ainda estabelecer um paralelo em relação à ideia de “trama e urdidura” e de “grelha”, também presentes no livro estudado, pois a organização e o ordenamento desses espaços delimitados propositalmente por pequenas dimensões e separações simples e diretas é capaz de expandir as possibilidades de uso individual, já que suscita inúmeras interpretações pessoais conforme os desejos decorativos ou simplesmente organizacionais particulares, além de serem marcadores privados localizados no corredor público.
![]() |
Planta Baixa do 3º Andar. Escola de Arquitetura (UFMG) |
Comentários
Postar um comentário